Editorial
O passado, o presente e o futuro do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra

Cátia Jorge
Jornalista Editora Raio-X
É com a terceira edição da MeetEndo e com um enorme orgulho do trabalho feito até aqui que chegamos ao final deste ano de 2024. Fechamos este ciclo com chave de ouro, com a comemoração dos 50 anos do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra. Meio século de inovação e de excelência difícil de resumir em tão poucas páginas, pois sabemos que muito mais haveria por contar. Fica a partilha de memórias e a sentida homenagem aos que desbravaram o caminho que trouxe o Serviço até aos dias de hoje. Dr. Manuel Almeida Ruas, Prof.ª Manuela Carvalheiro, Dr. Francisco Carrilho, Dr.ª Margarida Bastos, Dr.ª Isabel Paiva são apenas algumas das figuras de referência da Endocrinologia nacional que, ao longo destes anos, ajudaram a erguer este serviço. É pela voz da Prof.ª Doutora Leonor Gomes, atual líder desta equipa, que nos são aqui apresentadas as atuais valências do Serviço, mas é com as recordações do Dr. Manuel Almeida Ruas que viajamos ao passado para reviver os desafios e as conquistas de quem cá esteve desde o primeiro dia. Uma entrevista para ler devagar e guardar no arquivo das memórias, para que sempre seja honrado este tão rico legado.
Voltamos em 2025 com mais reportagens pelos caminhos da Endocrinologia portuguesa.
Feliz Ano Novo!





Endocrinologia somos nós
Serviço de Endocrinologia da ULS de Coimbra: 50 anos de inovação e excelência

Prof.ª Doutora Leonor Gomes
Diretora do Serviço
Na terceira edição da MeetEndo, fomos conhecer o Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra, uma visita que coincidiu com a celebração dos 50 anos desta unidade de referência que foi fundada a 1 de novembro de 1974. A diretora, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes, e a sua equipa, falaram da evolução ao longo dos últimos 50 anos e também sobre como está, atualmente, organizado este Serviço.
35 dos 50 anos da existência desta unidade foram vividos pela sua atual diretora que, em 1989, entrou aqui como médica interna de Endocrinologia e Nutrição. Na história da criação do Serviço não podia ficar de fora a referência ao Dr. Manuel Almeida Ruas, fundador e atual decano da Endocrinologia nacional, “e do qual temos muito orgulho”, refere a Prof.ª Doutora Leonor Gomes.
“Inicialmente, houve um conjunto de pessoas que teve um papel importantíssimo no desenvolvimento do Serviço e também da própria Endocrinologia, a nível local e a nível nacional. Esse conjunto de pessoas inclui a Prof.ª Doutora Manuela Carvalheiro, o Dr. Francisco Carrilho - ambos vieram a ser diretores do Serviço -, a Dr.ª Elizabete Geraldes, a Dr.ª Beatriz Campos e o Dr. Simões Pereira - que vieram a ser diretores de Serviço do IPO de Coimbra e do Hospital de Aveiro, respetivamente. Temos ainda neste núcleo, um pouco mais tarde, mas também essenciais ao seu desenvolvimento, a Dr.ª Margarida Bastos e a Dr.ª Isabel Paiva (última diretora e que saiu em março de 2024)”. O papel desempenhado por cada um dos antigos diretores não foi esquecido pela atual responsável: “foram pessoas de exceção e que permitiram afirmar a Endocrinologia e constituir o Serviço que temos atualmente. Hoje somos a continuidade deste espírito que é notável desde a sua formação”.
Uma equipa unida e focada no doente
Ao longo deste meio século, o Serviço foi crescendo em pessoas e valências. No que diz respeito à equipa, em outubro de 2024, eram 65 elementos: 29 médicos (nos quais se incluem 10 médicos internos), 21 enfermeiros, sete assistentes técnicas e oito técnicas auxiliares de saúde. Existe ainda uma nutricionista que é do Serviço de Nutrição, mas que está alocada à Endocrinologia. Relativamente aos elementos que integram esta equipa, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes afirma serem “um conjunto de pessoas extraordinárias, quer do ponto de vista profissional, quer do ponto de vista humano”.
A médica endocrinologista destaca como uma das mais-valias do Serviço, precisamente, “o espírito de coesão e a procura em dar sempre o tratamento mais atual e moderno. Somos muito focados no doente e somos muito unidos. Existe uma continuidade e que se perpetuou ao longo das diferentes direções e gerações que já passaram por aqui: este Serviço já formou 45 endocrinologistas ao longo destes 50 anos”.
Também a Dr.ª Carolina Moreno, há 14 anos na equipa, define-a como “muito dinâmica, exigente e que nos oferece um grande apoio a todos os níveis, especialmente ao articular a vertente científica e profissional com a humana. Sentimos esse apoio genuíno, o que nos permite estar no nosso melhor para atender e servir os doentes, integrando diversas áreas que elevam a qualidade profissional que procuramos”.

Equipa Médica
Relativamente à evolução das valências, a diretora do Serviço destaca “a passagem do antigo hospital para estas instalações, o que permitiu um maior espaço”. As consultas externas – organizadas entre gerais, diferenciadas e multidisciplinares – são da sua responsabilidade e da “área assistencial mais vasta do Serviço”, que tem ainda sob a sua alçada a urgência em Endocrinologia - que é assegurada todos os dias da semana (incluindo feriados) e fins de semana, no período diurno, das 9h às 21h -, o Internamento, o Hospital de Dia, o Centro de Tratamento PSCI Adultos, a Unidade Funcional do PCI Diabetes tipo 2 e as Áreas Técnicas.
Diabetes e PSCI
A Dr.ª Luísa Barros, no serviço desde 1992, é atualmente a responsável pelas Consultas de Transição em Diabetes e de Diabetes e PSCI (perfusão subcutânea contínua de insulina). Acumula também a função de coordenadora do Centro de Tratamento de PSCI da ULS de Coimbra.
Estando mais dedicada à diabetes de tipo 1, a endocrinologista destaca a “evolução enormíssima” que tem havido nesta área. “Começámos no Serviço com o Dr. Almeida Ruas, que já era uma pessoa com um forte empenho e dedicação a esta patologia - foi a primeira pessoa no país a iniciar a insulinoterapia intensiva no diabético de tipo 1. A partir daí, sempre que havia uma novidade, éramos o primeiro Serviço a implementá-la”, refere a Dr.ª Luísa Barros acrescentando ainda que o Serviço foi também pioneiro na monitorização contínua da glicose e nas bombas de insulina – “aí foi o Dr. Francisco Carrilho a iniciar este tratamento nos doentes, na década de 90”.
A especialista destaca o trabalho que é feito em equipa, fator que “diferencia e acrescenta valor”, existindo sempre uma preocupação com o doente, mas acompanhando a evolução da tecnologia – “hoje, a tecnologia é um parceiro imprescindível na diabetes de tipo 1 e que veio para facilitar a vida ao doente, permitindo que o controlo seja o melhor possível”. Atual-mente, são cerca de 70 os doentes com sistemas automáticos de administração de insulina e “algumas pessoas que usam este sistema dizem-nos que até se esquecem que têm a doença. Os resultados são muito bons, mas requerem, de facto, um trabalho muito grande de toda a equipa e do doente também”.

Equipa de Técnicas Auxiliares de Saúde
Consulta de Obesidade
Já há 27 anos no Serviço, a Dr.ª Dircea Rodrigues é a responsável do Internamento, da Consulta Especializada em Obesidade e da Consulta Multidisciplinar de Distúrbios Alimentares.
Relativamente à Consulta de Obesidade, “já tem uma história longa, com mais de 20 anos. Terminei a minha especialidade e, com a orientação do Dr. Almeida Ruas, fiz um protocolo para iniciar esta consulta. Claro que foi crescendo, dada a enorme prevalência desta patologia no nosso país, e fomos recebendo cada vez mais doentes”, conta a endocrinologista.
A especialista foi uma das responsáveis pela candidatura do Hospital, feita em 2007, a Centro de Tratamento Cirúrgico da Obesidade e recorda que, aquando da aprovação, “tivemos de afunilar os critérios de referenciação. Neste momento, só vão para a Consulta de Obesidade doentes mais críticos, que têm associadas à doença complicações graves e é deste pool de doentes que selecionamos os que têm indicação para tratamento cirúrgico”.
Anualmente, são realizadas cerca de 400 cirurgias, existindo uma equipa cirúrgica unicamente dedicada a esta valência. Existe ainda uma consulta multidisciplinar de Avaliação Multidisciplinar de Tratamento Cirúrgico da Obesidade após a qual os doentes entram na lista de espera que é “reduzida, cerca de quatro meses, sendo que o que está estipulado pela Direção Geral de Saúde são seis meses”.
Endocrinologia e Gravidez
A Dr.ª Sandra Paiva dedica grande parte da sua atividade à vertente “muito boa da Endocrinologia”: é responsável pela Consulta Multidisciplinar de Endocrinologia e Gravidez. Para a especialista, que integra o serviço desde 1994, ano em que começou aqui o seu internato, esta “é uma consulta muito agradável porque, ao contrário das outras consultas, nesta o desfecho (na grande maioria das vezes) é muito bom, nasce um bebé. Ficamos muito ligados a essas crianças, é engraçado”.
Esta foi a primeira consulta multidisciplinar criada no Serviço, na altura pela Prof.ª Doutora Manuela Carvalheiro, havendo, atualmente, cinco períodos de consulta nos quais o endocrinologista se desloca à Maternidade. Também aqui é destacado o papel que a evolução tecnológica desempenha no tratamento da mulher diabética grávida, nomeadamente através da colocação das bombas infusoras de insulina, com “resultados extraordinários” e permitindo que exista “um controlo metabólico mais fino”, salienta a Dr.ª Sandra Paiva.

Equipa de Enfermagem
Ecografia e Punção Ecoguiada
A médica endocrinologista é também a responsável pela área técnica da Ecografia e Punção Ecoguiada – valência que iniciou em 2006, pelas mãos da Dr.ª Cristina Ribeiro, que está muito desenvolvida no Serviço e que, para a Dr.ª Sandra Paiva, traz muitos benefícios para o doente: “a acessibilidade que temos a esta técnica - que é essencial no seguimento dos doentes com patologia da tiroide – e de fazermos esses exames dentro do próprio Serviço, permite que haja uma articulação que beneficia muito o doente”. Neste momento, são realizados mais de três mil procedimentos por ano.
A Dr.ª Cristina Ribeiro, há 35 anos no Serviço, relembra que, na altura, a ideia de se fazerem as ecografias “surgiu aqui no Serviço pois começámos a ver que a ecografia era um instrumento importante para um endocrinologista. Iniciámos com duas pessoas e fomos avançando, passo a passo. Primeiro, apenas com ecografias, mas logo a seguir avançámos para a punção, que era a nossa grande ideia. De um modo geral, penso que tem corrido muito bem, porque, para nós, foi um grande avanço poder coordenar a parte clínica e a parte ecográfica de forma muito próxima.”
Atualmente, a médica endocrinologista é responsável pela consulta especializada em Oncologia Tiroideia – “uma consulta também com muita procura, estão sempre a entrar os doentes operados e, portanto, acabamos por ser três a fazer esta consulta e a ter as agendas todas já muito preenchidas”. Existe também a consulta multidisciplinar de Decisão Terapêutica Oncologia Tiroideia, realizada com uma periodicidade mensal, que envolve, além da Endocrinologia, a Anatomia Patológica, a Medicina Nuclear e a Otorrinolaringologia.
Endocrinologia URGOS
Outra das consultas multidisciplinares que é realizada no Serviço é a de Endocrinologia-URGOS – Unidade Reconstrutiva Génito-Urinária. A Dr.ª Luísa Ruas, na equipa desde 1991, está afeta a esta valência e explicou como a mesma está organizada: “é uma consulta multidisciplinar, embora esteja dividida por áreas logísticas diferentes, ou seja, a consulta da Cirurgia Plástica é no Serviço de Cirurgia Plástica, a consulta de Psiquiatria e Psicologia é no Serviço de Psiquiatria e a nossa de Endocrinologia é aqui neste Serviço. Ainda temos depois outras valências, nomeadamente o Otorrino, a Terapia da Voz, a preservação da fertilidade, tudo isso em departamentos diferentes. No serviço, já é a abordagem das pessoas transgénero quando vêm da consulta de Sexologia, nomeadamente Psiquiatria e Psicologia. Portanto, são eles que fazem o diagnóstico da incongruência de género, já vêm com o re-latório, nós fazemos a terapia hormonal”.
Esta é uma área com uma enorme procura, tal como refere a Dr.ª Luísa Ruas: “tenho consulta semanal, sempre cheia, e temos uma lista de espera de mais de seis meses, que pode mesmo chegar a um ano”. Neste âmbito, a médica endocrinologista gostaria que, no futuro, existisse um espaço que permitisse a todas as especialidades estarem juntas de forma a facilitar o esclarecimento de dúvidas que vão surgindo ao longo do processo.
Transplantação Renal e Diabetes
Foi em 1992, com a Dr.ª Margarida Bastos, que foi fundada a consulta multidisciplinar de Transplantação Renal e Diabetes e que, atualmente, é da responsabilidade da Dr.ª Carla Batista. A Endocrinologia, a Nefrologia e a Urologia são as especialidades que estão envolvidas nesta valência.
A especialista explica que “aqui, são seguidos os doentes diabéticos tipo 1 e 2 que foram submetidos a um transplante renal e doentes que desenvolveram a sua diabetes após o transplante. São doentes complicados, com muitas comorbilidades e tentamos, claro, otimizar o controlo glicémico, mas também controlarmos todos os fatores de risco que estes doentes apresentam, nomeadamente na parte cardiovascular, de modo a tentarmos que a sobrevivência deles e do enxerto seja sobreponível a doentes que não tenham diabetes”.
“Acho que tem sido uma missão que temos estado a conseguir cumprir e, sem dúvida, muito devido ao facto de a consulta ser multidisciplinar”, avalia a Dr.ª Carla Batista que fez aqui o seu internato, tendo entrado no ano de 1993 no Serviço.
Tumores da Suprarrenal
Criada pela anterior diretora do Serviço, a Dr.ª Isabel Paiva, a Consulta de Tumores da Suprarrenal está sob a responsabilidade da Dr.ª Carolina Moreno. É uma consulta destinada a “fazer o seguimento e a integração multidisciplinar de cuidados a todos os doentes com feocromocitoma e carcinoma do córtex suprarrenal” explica a especialista.
Neste âmbito, a endocrinologista destaca o “privilégio, neste centro hospitalar, de podermos contar com a possibilidade de articulação com múltiplas modalidades de intervenção terapêutica e é este o principal objetivo desta consulta: fazer esse acompanhamento, estabelecer sobretudo pontes para outras soluções terapêuticas que vão além do tratamento médico - o tratamento cirúrgico, tratamento com radionuclídeos, com radioterapia - e, portanto, temos vindo a fazer esse trabalho, mas que ainda está em de-senvolvimento”.
Internamento
Quanto ao Internamento, a sua coordenação é outra das responsabilidades da Dr.ª Dircea Rodrigues. Têm 13 camas disponíveis para internar doentes com patologia endócrina sendo de destacar, pela especialista, o trabalho de toda a equipa envolvida: “todos contam, a equi-pa médica, os enfermeiros, os auxiliares, o secretariado”.
“Os doentes que internamos vêm essencialmente da urgência, com patologia aguda de todas as doenças endócrinas, mas principalmente da diabetes. Depois somos todos os especialistas do Serviço que programamos o internamento de alguns doentes das várias consultas externas que temos, para completar diagnósticos, para fazer nova terapêutica ou mudança da atual. Podem também vir transferidos de outros serviços do hospital”, explica a médica endocrinologista.

Equipa de Assistentes Técnicas
Relativamente à organização, o internamento está dividido em duas unidades funcionais, em que cada unidade tem dois a três especialistas e médicos internos. Em termos de formação para os médicos internos, a Dr.ª Dircea Rodrigues destaca a importância da experiência nesta valência pois é possível ter contacto com patologias que não são vistas em consulta.
Esta formação dos internos é outro dos pontos essenciais para o Serviço.
Internato e formação
“O que nos move - a curiosidade, a vivacidade, o dinamismo - vem muito dos médicos internos, e, portanto, eles são essenciais num serviço”, refere a Prof.ª Doutora Leonor Gomes. A diretora do Serviço não tem dúvidas da mais-valia que representa a formação dos internos: “obrigam-nos a trabalhar, trazem-nos novidades e o seu entusiasmo. Por vezes vamos acomodando-nos e eles movem-nos e exigem, no bom sentido, que continuemos cada vez melhor. E, portanto, eu acho que é uma força muito importante a juventude dos médicos internos e as suas capacidades. Nós temos tido médicos internos excelentes”.
O trabalho de formação pré e pós graduada é uma vertente também muito importante neste Serviço: a Prof.ª Doutora Leonor Gomes é regente da Unidade Curricular de Endocrinologia no Mestrado Integrado de Medicina da FMUC (Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra), existindo ainda outros elementos do Serviço que asseguram as aulas práticas.
A Dr.ª Mafalda Ferreira e a Dr.ª Ana Carreira fazem parte dos 10 médicos internos que estão, atualmente, em formação no Serviço estando ambas no 5.º ano do internato. Destacando a experiência como muito positiva, a Dr.ª Mafalda Ferreira refere que este tem sido um “período muito exigente, pois a Endocrinologia é uma especialidade bastante abrangente e, portanto, requer muito estudo. Mas, acima de tudo, este Serviço, ao integrar várias áreas, vários especialistas e ao ser multidisciplinar, permite-nos ter contato com um grande volume de patologias e aprender imenso. Saímos muito bem preparados no final do internato”.
Já a Dr.ª Ana Carreira reflete sobre o facto de integrar um Serviço com 50 anos de existência: “traz alguma responsabilidade, é um Serviço que sempre foi pautado pela elevada exigência e queremos estar à altura. Acho que, nesse sentido, temos umas botas um pouco grandes para calçar, mas, acima de tudo, é um grande orgulho pertencer a este Serviço. Vivemos uma altura muito diferente de há 50 anos, temos mais doentes, temos mais pressão também do trabalho, mas tentamos manter o mesmo bom ambiente que também existia na altura, quer entre colegas médicos, quer com os auxiliares, com os nossos enfermeiros, com os secretários. Estamos sempre a aprender uns com os outros e isso acho que é uma mais-valia”.
Além do trabalho assistencial, da formação pré e pós graduada há ainda algum espaço para o trabalho científico: “temos essa vertente, às vezes um pouco menos desenvolvida devido à grande carga assistencial, mas desenvolvemo-la no Serviço, dentro da instituição e também em parceria com outras instituições reconhecidas a nível nacional como, por exemplo, o i3S, ou o CIBIT - Coimbra Institute for Biomedical Imaging and Translational Research, que é um centro de investigação no ICNAS - Instituto de Ciências Nucleares Aplicadas à Saúde”, refere a Prof.ª Doutora Leonor Gomes. A Dr.ª Carolina Moreno, atualmente a fazer doutoramento, refere também esta “forte componente académica e científica do Serviço” tendo sido “incentivada desde cedo para prosseguir essa carreira”. De momento, são quatro os elementos do Serviço que ingressaram no programa doutoral – “temos vindo a perseguir várias linhas de investigação e que esperamos que venham a dar frutos interessantes em diversas áreas da Endocrinologia”, refere a especialista.
Equipa de Enfermagem
A Enf.ª Isabel Lopes é a pessoa mais antiga do Serviço: há 38 anos que integra esta equipa.
Atualmente, assume as funções de chefia da equipa de enfermagem e das técnicas auxiliares de saúde e explica algumas das principais atividades que desempenham no Serviço: “sempre que um doente é internado, temos a intervenção para o ajudar durante o seu internamento: avaliar as suas capacidades para a gestão da doença e depois fazer os ensinos oportunos. E depois também há o acompanhamento na consulta externa na qual os enfermeiros integram também a equipa multidisciplinar e, juntamente com os médicos, fazem o seu ensino sobre o que acham necessário para o doente poder dar uma resposta mais eficaz na sua doença”.

Médicos Internos do Serviço
Ligação aos CSP
Realizadas desde 1979, as Jornadas de Endocrinologia e Diabetes de Coimbra são um marco da vida deste Serviço e acontecem em novembro, mês da diabetes. “De forma organizada, são as jornadas mais antigas a nível nacional e a filosofia na altura, e que persiste no Serviço, é a partilha do conhecimento com os nossos pares. São sobretudo vocacionadas para a Medicina Geral e Familiar de forma a estabelecer um comportamento concertado e uniforme entre a especialidade e os Cuidados de Saúde Primários (CSP) para que o doente possa ser melhor acompanhado e de uma forma mais segura. Além de promover o convívio entre todos”, explica a atual diretora do Serviço.
Ainda no âmbito desta articulação com os CSP, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes refere a mais recente novidade: em janeiro de 2024, foi proposto ao Serviço integrar um grupo de trabalho constituído para desenvolver um percurso clínico integrado para a diabetes tipo 2 na ULS de Coimbra. “O doente é incluído num percurso clínico integrado pelas diferentes áreas e, neste momento, só está implementado o teleseguimento com uma assistente virtual, ainda não está implementada a telemonitorização, portanto o circuito ainda não está todo implementado, daí que ainda seja muito prematuro tirar conclusões. Mas o objetivo último será retirar doentes da urgência, ir procurar os doentes que andam menos controlados, tratá-los melhor e fazê-los sentirem-se mais acompanhados”.
O futuro da Endocrinologia: tecnologia e acessibilidade
Esta questão da aplicação da tecnologia na Medicina é algo que a diretora também referiu como uma marca importante na história do Serviço: “vivemos um estado pós-pandémico o que acelerou imenso a tecnologia e a sua aplicabilidade. A tecnologia na Medicina é cada vez mais robusta, nomeadamente na Endocrinologia”. Perante isto, questionada sobre como imagina a comemoração do 100.º aniversário do Serviço, a sua atual diretora afirma que “provavelmente, o doente estará no seu domicílio e nós é que chegaremos até ele”.
Num futuro mais próximo, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes reforça que gostaria de melhorar a acessibilidade a algumas das consultas com maior procura pela população: a área de abrangência deste Serviço é de 400 mil pessoas e, se for considerada a região Centro, sendo um hospital de fim de linha, são dois milhões de pessoas às quais têm de dar resposta em algumas patologias.
“Temos vindo sempre a melhorar, mas ainda é necessário darmos mais um passo para que a acessibilidade seja o que desejaríamos”, refere a diretora. A médica endocrinologista acrescenta ainda, relativamente ao futuro, “que vai ser sempre uma atividade de continuidade - o Serviço era visionário e, portanto, será no âmbito da continuidade que vamos tentar desenvolver mais algumas áreas específicas e diferenciadas e até multidisciplinares e tentar ampliar a parte científica. Não esquecendo nunca - e isso é que eu considero que temos de ter sempre presente - a humanização e a coesão do serviço, não podemos descurar de forma alguma estes dois fatores que acho essenciais”.
Apesar de todas estas valências, o destaque mais importante são sempre as pessoas, “sem elas era impossível existirem todas estas atividades”. E aqui incluo todos os grupos profissionais que constituem a equipa, pois todos são também excelentes e contribuem imenso para a união e para o bom funcionamento e prestação de cuidados aos doentes”, conclui a diretora do Serviço.
O serviço pela voz da sua diretora
A perspetiva da equipa




Fora do consultório
Dr. Almeida Ruas: a história do Serviço de Endocrinologia da ULS de Coimbra pela voz do seu fundador

Dr. Almeida Ruas
Numa edição em que assinalamos os 50 anos do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra, fomos recebidos pelo seu fundador e atual decano da Endocrinologia nacional: o Dr. Manuel Almeida Ruas. A sua especialização em Endocrinologia, interrompida pela presença na Guerra Colonial, e o processo de fundação do Serviço foram alguns dos temas que não ficaram de fora nesta conversa.
Nascido no ano de 1931, em 1957 o Dr. Almeida Ruas conclui a sua licenciatura em Medicina pela Faculdade de Medicina de Coimbra com a nota final de 18 valores. Foi de imediato convidado para assistente da Faculdade na cadeira de Terapêutica, “estava encarregado das aulas práticas e depois, a partir de determinada altura, também de algumas teóricas”, recorda o endocrinologista.
Relativamente ao interesse pela Endocrinologia, surge “porque em Coimbra, na altura, não havia ninguém com esta especialização. Naquele tempo, a nível nacional, existiam poucos endocrinologistas. Assim, pôs-se a hipótese de me diferenciar nesta área e, para isso, solicitaram-se apoios para que o pudesse fazer no estrangeiro”. Desta forma, entre 1961 e 1962, o Dr. Almeida Ruas fez a sua especialização em Paris, no Hospital Pitié-Salpêtrière, com Jacques Décur - “o grande homem europeu da Endocrinologia”. No ano seguinte, “como as doenças da tiroide são muito frequentes na especialidade, fui para o London Hospital, do Raymond Greene, que se dedicava única e exclusivamente às doenças da tiroide”.
Após o regresso, onde voltou ao cargo ocupado anteriormente na Faculdade de Medicina de Coimbra, em 1966, foi reinspeccionado para o serviço militar e apurado para ir para a Guerra Colonial. Foi integrado como médico militar no Batalhão de Caçadores 1891 e colocado em Moçambique entre abril de 1966 e setembro de 1968. Este episódio, recorda o Dr. Almeida Ruas, quebrou o ritmo que trouxe da sua experiência internacional, “mas ressuscitei-o rapidamente, porque voltei para a Faculdade e para o Hospital e, é nessa altura, que se pensa fazer uma diferenciação em Endocrinologia na instituição”. “Primeiro, sob a minha responsabilidade, com alguns colegas de Medicina Geral, foram criadas as consultas de doenças da tiroide e da diabetes e no resto do Hospital começaram a perceber que deveriam encaminhar para nós tudo o que era deste foro”, relembra o especialista.
1974: nascimento do Serviço
A abertura que o 25 de Abril de 1974 permitiu foi também essencial para que pudesse ser criada a especialidade de Endocrinologia. “As pessoas interessadas em diferenciar serviços fizeram uma comissão que foi presidida pelo Prof. Gouveia Monteiro. Então, nessa reunião, com vários colegas interessados, surgiu a Nefrologia, a Hematologia, a Gastroenterologia e a Endocrinologia nos HUC”. É assim que, em 1974, o Dr. Almeida Ruas se torna o fundador da Unidade de Endocrinologia e Doenças Metabólicas dos HUC. Dois anos mais tarde, já com uma equipa a trabalhar consigo, passou a Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, tendo então assumido a função de diretor até à data em que se aposentou, em 2001.
“Quando eu saí, já havia no Serviço uma série de consultas diferenciadas, vários dias da semana, como a consulta da tiroide, a consulta de diabetes e gravidez - que ainda hoje se mantém e que tem uma importância particularmente grande. Havia também diferenciação nas perturbações do crescimento, os nanismos, portanto, quando saí, não era propriamente Endocrinologia no sentido lato da palavra, mas sim já com vários setores, já estava muito desenvolvido”, recorda o especialista.
As Jornadas de Endocrinologia
Em 1979 o seu serviço é responsável pela criação das Jornadas de Endocrinologia e Diabetes de Coimbra - “primeiro começou só por diabetes, durante uns anos eram as Jornadas de Diabetologia de Coimbra, e depois juntou-se também mais um dia para a Endocrinologia”. Este evento é mantido até hoje, tendo decorrido em 2024 a sua 28.ª edição.
Inevitavelmente, o Dr. Almeida Ruas recorda a formação do Serviço de Endocrinologia como um dos momentos mais marcantes da sua carreira. Carreira que foi marcada por uma série de reconhecimentos e distinções pelo papel fundamental que representa para a es-pecialidade. Na data em que cessou oficialmente as suas funções, 7 de junho de 2001, foi-lhe atribuída pelo Ministério da Saúde a Medalha de Prata de Serviços Distintos e foi também reconhecido pela Ordem dos Médicos com a atribuição de uma Medalha de Mérito.
A Endocrinologia atualmente
Questionado sobre como vê a especialidade atualmente, o Dr. Almeida Ruas destaca “a grande evolução que tem existido na Endocrinologia, sobretudo pelas ciências afins. Por exemplo, pela genética - hoje fazem-se os estudos genéticos que, na altura, não fazíamos – e pelo laboratório. Enquanto que, na minha formação, mesmo em Paris e em Londres, as análises eram feitas na urina, o que significava que nós íamos dosear fragmentos das hormonas e através disso raciocinávamos, hoje em dia nada disso se passa. O laboratório de Endocrinologia desenvolveu-se de uma maneira extraordinária em virtude, precisamente, da genética também se ter desenvolvido da forma que hoje sabemos”.
O atual decano da Endocrinologia nacional, termina deixando uma mensagem às gerações mais novas que ingressam na especialidade: “antes de escolherem alguma especialização dentro da Endocrinologia, procurem ter uma panorâmica total do que é a especialidade. Hoje, alguém que entra num serviço de Endocrinologia tem a possibilidade de fazer uma boa formação, pois os profissionais são pessoas bastantes conhecedoras”.
Assista ao vídeo da entrevista

A Menarini esteve aqui
Conferência internacional aborda os avanços no tratamento da diabetes
O Grupo Menarini organizou, nos dias 12 e 13 de abril de 2024, em Florença, Itália, a conferência “Act 2 Day - Diabetes 25 Years After the Start of the New Millennium”. Entre outros objetivos, o evento pretendeu fazer uma atualização dos conhecimentos sobre a relação entre diabetes e outras doenças metabólicas, cardiovasculares e renais, além de promover discussões sobre as barreiras atuais no tratamento da diabetes e a importância de uma abordagem multidisciplinar para o cuidado ideal ao longo de todo o espectro metabólico e cardiorrenal. O tema “quente” do papel da Inteligência Artificial na otimização do controlo da doença também não foi deixado de fora. Dirigida a especialistas em Medicina Geral e Familiar, endocrinologistas, diabetologistas, nefrologistas, cardiologistas e internistas, foram 11 os países europeus presentes. Portugal esteve representado pelo Prof. Doutor Davide Carvalho que participou como palestrante e apresentou o tema “How Early Using New Glucose-Lowering Agents?”.
Produção

Rua Herminia Silva nº8 Loja A
2620-535 Ramada, Portugal
geral@raiox.pt
www.raiox.pt
Equipa
REDAÇÃO:
Andreia Pinto
Cátia Jorge
Rita Rodrigues
FOTOGRAFIA E VIDEO:
João Ferrão
Tiago Gonçalves
DESIGN:
Diogo Silva
APOIO

Editorial
O passado, o presente e o futuro do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra

Cátia Jorge
Jornalista Editora Raio-X
É com a terceira edição da MeetEndo e com um enorme orgulho do trabalho feito até aqui que chegamos ao final deste ano de 2024. Fechamos este ciclo com chave de ouro, com a comemoração dos 50 anos do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra. Meio século de inovação e de excelência difícil de resumir em tão poucas páginas, pois sabemos que muito mais haveria por contar. Fica a partilha de memórias e a sentida homenagem aos que desbravaram o caminho que trouxe o Serviço até aos dias de hoje. Dr. Manuel Almeida Ruas, Prof.ª Manuela Carvalheiro, Dr. Francisco Carrilho, Dr.ª Margarida Bastos, Dr.ª Isabel Paiva são apenas algumas das figuras de referência da Endocrinologia nacional que, ao longo destes anos, ajudaram a erguer este serviço. É pela voz da Prof.ª Doutora Leonor Gomes, atual líder desta equipa, que nos são aqui apresentadas as atuais valências do Serviço, mas é com as recordações do Dr. Manuel Almeida Ruas que viajamos ao passado para reviver os desafios e as conquistas de quem cá esteve desde o primeiro dia. Uma entrevista para ler devagar e guardar no arquivo das memórias, para que sempre seja honrado este tão rico legado.
Voltamos em 2025 com mais reportagens pelos caminhos da Endocrinologia portuguesa.
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Endocrinologia somos nós
Serviço de Endocrinologia da ULS de Coimbra: 50 anos de inovação e excelência

Prof.ª Doutora Leonor Gomes
Diretora do Serviço
Na terceira edição da MeetEndo, fomos conhecer o Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra, uma visita que coincidiu com a celebração dos 50 anos desta unidade de referência que foi fundada a 1 de novembro de 1974. A diretora, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes, e a sua equipa, falaram da evolução ao longo dos últimos 50 anos e também sobre como está, atualmente, organizado este Serviço.
35 dos 50 anos da existência desta unidade foram vividos pela sua atual diretora que, em 1989, entrou aqui como médica interna de Endocrinologia e Nutrição. Na história da criação do Serviço não podia ficar de fora a referência ao Dr. Manuel Almeida Ruas, fundador e atual decano da Endocrinologia nacional, “e do qual temos muito orgulho”, refere a Prof.ª Doutora Leonor Gomes.
“Inicialmente, houve um conjunto de pessoas que teve um papel importantíssimo no desenvolvimento do Serviço e também da própria Endocrinologia, a nível local e a nível nacional. Esse conjunto de pessoas inclui a Prof.ª Doutora Manuela Carvalheiro, o Dr. Francisco Carrilho - ambos vieram a ser diretores do Serviço -, a Dr.ª Elizabete Geraldes, a Dr.ª Beatriz Campos e o Dr. Simões Pereira - que vieram a ser diretores de Serviço do IPO de Coimbra e do Hospital de Aveiro, respetivamente. Temos ainda neste núcleo, um pouco mais tarde, mas também essenciais ao seu desenvolvimento, a Dr.ª Margarida Bastos e a Dr.ª Isabel Paiva (última diretora e que saiu em março de 2024)”. O papel desempenhado por cada um dos antigos diretores não foi esquecido pela atual responsável: “foram pessoas de exceção e que permitiram afirmar a Endocrinologia e constituir o Serviço que temos atualmente. Hoje somos a continuidade deste espírito que é notável desde a sua formação”.
Uma equipa unida e focada no doente
Ao longo deste meio século, o Serviço foi crescendo em pessoas e valências. No que diz respeito à equipa, em outubro de 2024, eram 65 elementos: 29 médicos (nos quais se incluem 10 médicos internos), 21 enfermeiros, sete assistentes técnicas e oito técnicas auxiliares de saúde. Existe ainda uma nutricionista que é do Serviço de Nutrição, mas que está alocada à Endocrinologia. Relativamente aos elementos que integram esta equipa, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes afirma serem “um conjunto de pessoas extraordinárias, quer do ponto de vista profissional, quer do ponto de vista humano”.
A médica endocrinologista destaca como uma das mais-valias do Serviço, precisamente, “o espírito de coesão e a procura em dar sempre o tratamento mais atual e moderno. Somos muito focados no doente e somos muito unidos. Existe uma continuidade e que se perpetuou ao longo das diferentes direções e gerações que já passaram por aqui: este Serviço já formou 45 endocrinologistas ao longo destes 50 anos”.
Também a Dr.ª Carolina Moreno, há 14 anos na equipa, define-a como “muito dinâmica, exigente e que nos oferece um grande apoio a todos os níveis, especialmente ao articular a vertente científica e profissional com a humana. Sentimos esse apoio genuíno, o que nos permite estar no nosso melhor para atender e servir os doentes, integrando diversas áreas que elevam a qualidade profissional que procuramos”.

Equipa Médica
Relativamente à evolução das valências, a diretora do Serviço destaca “a passagem do antigo hospital para estas instalações, o que permitiu um maior espaço”. As consultas externas – organizadas entre gerais, diferenciadas e multidisciplinares – são da sua responsabilidade e da “área assistencial mais vasta do Serviço”, que tem ainda sob a sua alçada a urgência em Endocrinologia - que é assegurada todos os dias da semana (incluindo feriados) e fins de semana, no período diurno, das 9h às 21h -, o Internamento, o Hospital de Dia, o Centro de Tratamento PSCI Adultos, a Unidade Funcional do PCI Diabetes tipo 2 e as Áreas Técnicas.
Diabetes e PSCI
A Dr.ª Luísa Barros, no serviço desde 1992, é atualmente a responsável pelas Consultas de Transição em Diabetes e de Diabetes e PSCI (perfusão subcutânea contínua de insulina). Acumula também a função de coordenadora do Centro de Tratamento de PSCI da ULS de Coimbra.
Estando mais dedicada à diabetes de tipo 1, a endocrinologista destaca a “evolução enormíssima” que tem havido nesta área. “Começámos no Serviço com o Dr. Almeida Ruas, que já era uma pessoa com um forte empenho e dedicação a esta patologia - foi a primeira pessoa no país a iniciar a insulinoterapia intensiva no diabético de tipo 1. A partir daí, sempre que havia uma novidade, éramos o primeiro Serviço a implementá-la”, refere a Dr.ª Luísa Barros acrescentando ainda que o Serviço foi também pioneiro na monitorização contínua da glicose e nas bombas de insulina – “aí foi o Dr. Francisco Carrilho a iniciar este tratamento nos doentes, na década de 90”.
A especialista destaca o trabalho que é feito em equipa, fator que “diferencia e acrescenta valor”, existindo sempre uma preocupação com o doente, mas acompanhando a evolução da tecnologia – “hoje, a tecnologia é um parceiro imprescindível na diabetes de tipo 1 e que veio para facilitar a vida ao doente, permitindo que o controlo seja o melhor possível”. Atual-mente, são cerca de 70 os doentes com sistemas automáticos de administração de insulina e “algumas pessoas que usam este sistema dizem-nos que até se esquecem que têm a doença. Os resultados são muito bons, mas requerem, de facto, um trabalho muito grande de toda a equipa e do doente também”.

Equipa de Técnicas Auxiliares de Saúde
Consulta de Obesidade
Já há 27 anos no Serviço, a Dr.ª Dircea Rodrigues é a responsável do Internamento, da Consulta Especializada em Obesidade e da Consulta Multidisciplinar de Distúrbios Alimentares.
Relativamente à Consulta de Obesidade, “já tem uma história longa, com mais de 20 anos. Terminei a minha especialidade e, com a orientação do Dr. Almeida Ruas, fiz um protocolo para iniciar esta consulta. Claro que foi crescendo, dada a enorme prevalência desta patologia no nosso país, e fomos recebendo cada vez mais doentes”, conta a endocrinologista.
A especialista foi uma das responsáveis pela candidatura do Hospital, feita em 2007, a Centro de Tratamento Cirúrgico da Obesidade e recorda que, aquando da aprovação, “tivemos de afunilar os critérios de referenciação. Neste momento, só vão para a Consulta de Obesidade doentes mais críticos, que têm associadas à doença complicações graves e é deste pool de doentes que selecionamos os que têm indicação para tratamento cirúrgico”.
Anualmente, são realizadas cerca de 400 cirurgias, existindo uma equipa cirúrgica unicamente dedicada a esta valência. Existe ainda uma consulta multidisciplinar de Avaliação Multidisciplinar de Tratamento Cirúrgico da Obesidade após a qual os doentes entram na lista de espera que é “reduzida, cerca de quatro meses, sendo que o que está estipulado pela Direção Geral de Saúde são seis meses”.
Endocrinologia e Gravidez
A Dr.ª Sandra Paiva dedica grande parte da sua atividade à vertente “muito boa da Endocrinologia”: é responsável pela Consulta Multidisciplinar de Endocrinologia e Gravidez. Para a especialista, que integra o serviço desde 1994, ano em que começou aqui o seu internato, esta “é uma consulta muito agradável porque, ao contrário das outras consultas, nesta o desfecho (na grande maioria das vezes) é muito bom, nasce um bebé. Ficamos muito ligados a essas crianças, é engraçado”.
Esta foi a primeira consulta multidisciplinar criada no Serviço, na altura pela Prof.ª Doutora Manuela Carvalheiro, havendo, atualmente, cinco períodos de consulta nos quais o endocrinologista se desloca à Maternidade. Também aqui é destacado o papel que a evolução tecnológica desempenha no tratamento da mulher diabética grávida, nomeadamente através da colocação das bombas infusoras de insulina, com “resultados extraordinários” e permitindo que exista “um controlo metabólico mais fino”, salienta a Dr.ª Sandra Paiva.

Equipa de Enfermagem
Ecografia e Punção Ecoguiada
A médica endocrinologista é também a responsável pela área técnica da Ecografia e Punção Ecoguiada – valência que iniciou em 2006, pelas mãos da Dr.ª Cristina Ribeiro, que está muito desenvolvida no Serviço e que, para a Dr.ª Sandra Paiva, traz muitos benefícios para o doente: “a acessibilidade que temos a esta técnica - que é essencial no seguimento dos doentes com patologia da tiroide – e de fazermos esses exames dentro do próprio Serviço, permite que haja uma articulação que beneficia muito o doente”. Neste momento, são realizados mais de três mil procedimentos por ano.
A Dr.ª Cristina Ribeiro, há 35 anos no Serviço, relembra que, na altura, a ideia de se fazerem as ecografias “surgiu aqui no Serviço pois começámos a ver que a ecografia era um instrumento importante para um endocrinologista. Iniciámos com duas pessoas e fomos avançando, passo a passo. Primeiro, apenas com ecografias, mas logo a seguir avançámos para a punção, que era a nossa grande ideia. De um modo geral, penso que tem corrido muito bem, porque, para nós, foi um grande avanço poder coordenar a parte clínica e a parte ecográfica de forma muito próxima.”
Atualmente, a médica endocrinologista é responsável pela consulta especializada em Oncologia Tiroideia – “uma consulta também com muita procura, estão sempre a entrar os doentes operados e, portanto, acabamos por ser três a fazer esta consulta e a ter as agendas todas já muito preenchidas”. Existe também a consulta multidisciplinar de Decisão Terapêutica Oncologia Tiroideia, realizada com uma periodicidade mensal, que envolve, além da Endocrinologia, a Anatomia Patológica, a Medicina Nuclear e a Otorrinolaringologia.
Endocrinologia URGOS
Outra das consultas multidisciplinares que é realizada no Serviço é a de Endocrinologia-URGOS – Unidade Reconstrutiva Génito-Urinária. A Dr.ª Luísa Ruas, na equipa desde 1991, está afeta a esta valência e explicou como a mesma está organizada: “é uma consulta multidisciplinar, embora esteja dividida por áreas logísticas diferentes, ou seja, a consulta da Cirurgia Plástica é no Serviço de Cirurgia Plástica, a consulta de Psiquiatria e Psicologia é no Serviço de Psiquiatria e a nossa de Endocrinologia é aqui neste Serviço. Ainda temos depois outras valências, nomeadamente o Otorrino, a Terapia da Voz, a preservação da fertilidade, tudo isso em departamentos diferentes. No serviço, já é a abordagem das pessoas transgénero quando vêm da consulta de Sexologia, nomeadamente Psiquiatria e Psicologia. Portanto, são eles que fazem o diagnóstico da incongruência de género, já vêm com o re-latório, nós fazemos a terapia hormonal”.
Esta é uma área com uma enorme procura, tal como refere a Dr.ª Luísa Ruas: “tenho consulta semanal, sempre cheia, e temos uma lista de espera de mais de seis meses, que pode mesmo chegar a um ano”. Neste âmbito, a médica endocrinologista gostaria que, no futuro, existisse um espaço que permitisse a todas as especialidades estarem juntas de forma a facilitar o esclarecimento de dúvidas que vão surgindo ao longo do processo.
Transplantação Renal e Diabetes
Foi em 1992, com a Dr.ª Margarida Bastos, que foi fundada a consulta multidisciplinar de Transplantação Renal e Diabetes e que, atualmente, é da responsabilidade da Dr.ª Carla Batista. A Endocrinologia, a Nefrologia e a Urologia são as especialidades que estão envolvidas nesta valência.
A especialista explica que “aqui, são seguidos os doentes diabéticos tipo 1 e 2 que foram submetidos a um transplante renal e doentes que desenvolveram a sua diabetes após o transplante. São doentes complicados, com muitas comorbilidades e tentamos, claro, otimizar o controlo glicémico, mas também controlarmos todos os fatores de risco que estes doentes apresentam, nomeadamente na parte cardiovascular, de modo a tentarmos que a sobrevivência deles e do enxerto seja sobreponível a doentes que não tenham diabetes”.
“Acho que tem sido uma missão que temos estado a conseguir cumprir e, sem dúvida, muito devido ao facto de a consulta ser multidisciplinar”, avalia a Dr.ª Carla Batista que fez aqui o seu internato, tendo entrado no ano de 1993 no Serviço.
Tumores da Suprarrenal
Criada pela anterior diretora do Serviço, a Dr.ª Isabel Paiva, a Consulta de Tumores da Suprarrenal está sob a responsabilidade da Dr.ª Carolina Moreno. É uma consulta destinada a “fazer o seguimento e a integração multidisciplinar de cuidados a todos os doentes com feocromocitoma e carcinoma do córtex suprarrenal” explica a especialista.
Neste âmbito, a endocrinologista destaca o “privilégio, neste centro hospitalar, de podermos contar com a possibilidade de articulação com múltiplas modalidades de intervenção terapêutica e é este o principal objetivo desta consulta: fazer esse acompanhamento, estabelecer sobretudo pontes para outras soluções terapêuticas que vão além do tratamento médico - o tratamento cirúrgico, tratamento com radionuclídeos, com radioterapia - e, portanto, temos vindo a fazer esse trabalho, mas que ainda está em de-senvolvimento”.
Internamento
Quanto ao Internamento, a sua coordenação é outra das responsabilidades da Dr.ª Dircea Rodrigues. Têm 13 camas disponíveis para internar doentes com patologia endócrina sendo de destacar, pela especialista, o trabalho de toda a equipa envolvida: “todos contam, a equi-pa médica, os enfermeiros, os auxiliares, o secretariado”.
“Os doentes que internamos vêm essencialmente da urgência, com patologia aguda de todas as doenças endócrinas, mas principalmente da diabetes. Depois somos todos os especialistas do Serviço que programamos o internamento de alguns doentes das várias consultas externas que temos, para completar diagnósticos, para fazer nova terapêutica ou mudança da atual. Podem também vir transferidos de outros serviços do hospital”, explica a médica endocrinologista.

Equipa de Assistentes Técnicas
Relativamente à organização, o internamento está dividido em duas unidades funcionais, em que cada unidade tem dois a três especialistas e médicos internos. Em termos de formação para os médicos internos, a Dr.ª Dircea Rodrigues destaca a importância da experiência nesta valência pois é possível ter contacto com patologias que não são vistas em consulta.
Esta formação dos internos é outro dos pontos essenciais para o Serviço.
Internato e formação
“O que nos move - a curiosidade, a vivacidade, o dinamismo - vem muito dos médicos internos, e, portanto, eles são essenciais num serviço”, refere a Prof.ª Doutora Leonor Gomes. A diretora do Serviço não tem dúvidas da mais-valia que representa a formação dos internos: “obrigam-nos a trabalhar, trazem-nos novidades e o seu entusiasmo. Por vezes vamos acomodando-nos e eles movem-nos e exigem, no bom sentido, que continuemos cada vez melhor. E, portanto, eu acho que é uma força muito importante a juventude dos médicos internos e as suas capacidades. Nós temos tido médicos internos excelentes”.
O trabalho de formação pré e pós graduada é uma vertente também muito importante neste Serviço: a Prof.ª Doutora Leonor Gomes é regente da Unidade Curricular de Endocrinologia no Mestrado Integrado de Medicina da FMUC (Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra), existindo ainda outros elementos do Serviço que asseguram as aulas práticas.
A Dr.ª Mafalda Ferreira e a Dr.ª Ana Carreira fazem parte dos 10 médicos internos que estão, atualmente, em formação no Serviço estando ambas no 5.º ano do internato. Destacando a experiência como muito positiva, a Dr.ª Mafalda Ferreira refere que este tem sido um “período muito exigente, pois a Endocrinologia é uma especialidade bastante abrangente e, portanto, requer muito estudo. Mas, acima de tudo, este Serviço, ao integrar várias áreas, vários especialistas e ao ser multidisciplinar, permite-nos ter contato com um grande volume de patologias e aprender imenso. Saímos muito bem preparados no final do internato”.
Já a Dr.ª Ana Carreira reflete sobre o facto de integrar um Serviço com 50 anos de existência: “traz alguma responsabilidade, é um Serviço que sempre foi pautado pela elevada exigência e queremos estar à altura. Acho que, nesse sentido, temos umas botas um pouco grandes para calçar, mas, acima de tudo, é um grande orgulho pertencer a este Serviço. Vivemos uma altura muito diferente de há 50 anos, temos mais doentes, temos mais pressão também do trabalho, mas tentamos manter o mesmo bom ambiente que também existia na altura, quer entre colegas médicos, quer com os auxiliares, com os nossos enfermeiros, com os secretários. Estamos sempre a aprender uns com os outros e isso acho que é uma mais-valia”.
Além do trabalho assistencial, da formação pré e pós graduada há ainda algum espaço para o trabalho científico: “temos essa vertente, às vezes um pouco menos desenvolvida devido à grande carga assistencial, mas desenvolvemo-la no Serviço, dentro da instituição e também em parceria com outras instituições reconhecidas a nível nacional como, por exemplo, o i3S, ou o CIBIT - Coimbra Institute for Biomedical Imaging and Translational Research, que é um centro de investigação no ICNAS - Instituto de Ciências Nucleares Aplicadas à Saúde”, refere a Prof.ª Doutora Leonor Gomes. A Dr.ª Carolina Moreno, atualmente a fazer doutoramento, refere também esta “forte componente académica e científica do Serviço” tendo sido “incentivada desde cedo para prosseguir essa carreira”. De momento, são quatro os elementos do Serviço que ingressaram no programa doutoral – “temos vindo a perseguir várias linhas de investigação e que esperamos que venham a dar frutos interessantes em diversas áreas da Endocrinologia”, refere a especialista.
Equipa de Enfermagem
A Enf.ª Isabel Lopes é a pessoa mais antiga do Serviço: há 38 anos que integra esta equipa.
Atualmente, assume as funções de chefia da equipa de enfermagem e das técnicas auxiliares de saúde e explica algumas das principais atividades que desempenham no Serviço: “sempre que um doente é internado, temos a intervenção para o ajudar durante o seu internamento: avaliar as suas capacidades para a gestão da doença e depois fazer os ensinos oportunos. E depois também há o acompanhamento na consulta externa na qual os enfermeiros integram também a equipa multidisciplinar e, juntamente com os médicos, fazem o seu ensino sobre o que acham necessário para o doente poder dar uma resposta mais eficaz na sua doença”.

Médicos Internos do Serviço
Ligação aos CSP
Realizadas desde 1979, as Jornadas de Endocrinologia e Diabetes de Coimbra são um marco da vida deste Serviço e acontecem em novembro, mês da diabetes. “De forma organizada, são as jornadas mais antigas a nível nacional e a filosofia na altura, e que persiste no Serviço, é a partilha do conhecimento com os nossos pares. São sobretudo vocacionadas para a Medicina Geral e Familiar de forma a estabelecer um comportamento concertado e uniforme entre a especialidade e os Cuidados de Saúde Primários (CSP) para que o doente possa ser melhor acompanhado e de uma forma mais segura. Além de promover o convívio entre todos”, explica a atual diretora do Serviço.
Ainda no âmbito desta articulação com os CSP, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes refere a mais recente novidade: em janeiro de 2024, foi proposto ao Serviço integrar um grupo de trabalho constituído para desenvolver um percurso clínico integrado para a diabetes tipo 2 na ULS de Coimbra. “O doente é incluído num percurso clínico integrado pelas diferentes áreas e, neste momento, só está implementado o teleseguimento com uma assistente virtual, ainda não está implementada a telemonitorização, portanto o circuito ainda não está todo implementado, daí que ainda seja muito prematuro tirar conclusões. Mas o objetivo último será retirar doentes da urgência, ir procurar os doentes que andam menos controlados, tratá-los melhor e fazê-los sentirem-se mais acompanhados”.
O futuro da Endocrinologia: tecnologia e acessibilidade
Esta questão da aplicação da tecnologia na Medicina é algo que a diretora também referiu como uma marca importante na história do Serviço: “vivemos um estado pós-pandémico o que acelerou imenso a tecnologia e a sua aplicabilidade. A tecnologia na Medicina é cada vez mais robusta, nomeadamente na Endocrinologia”. Perante isto, questionada sobre como imagina a comemoração do 100.º aniversário do Serviço, a sua atual diretora afirma que “provavelmente, o doente estará no seu domicílio e nós é que chegaremos até ele”.
Num futuro mais próximo, a Prof.ª Doutora Leonor Gomes reforça que gostaria de melhorar a acessibilidade a algumas das consultas com maior procura pela população: a área de abrangência deste Serviço é de 400 mil pessoas e, se for considerada a região Centro, sendo um hospital de fim de linha, são dois milhões de pessoas às quais têm de dar resposta em algumas patologias.
“Temos vindo sempre a melhorar, mas ainda é necessário darmos mais um passo para que a acessibilidade seja o que desejaríamos”, refere a diretora. A médica endocrinologista acrescenta ainda, relativamente ao futuro, “que vai ser sempre uma atividade de continuidade - o Serviço era visionário e, portanto, será no âmbito da continuidade que vamos tentar desenvolver mais algumas áreas específicas e diferenciadas e até multidisciplinares e tentar ampliar a parte científica. Não esquecendo nunca - e isso é que eu considero que temos de ter sempre presente - a humanização e a coesão do serviço, não podemos descurar de forma alguma estes dois fatores que acho essenciais”.
Apesar de todas estas valências, o destaque mais importante são sempre as pessoas, “sem elas era impossível existirem todas estas atividades”. E aqui incluo todos os grupos profissionais que constituem a equipa, pois todos são também excelentes e contribuem imenso para a união e para o bom funcionamento e prestação de cuidados aos doentes”, conclui a diretora do Serviço.
O serviço pela voz da sua diretora
A perspetiva da equipa


Fora do consultório
Dr. Almeida Ruas: a história do Serviço de Endocrinologia da ULS de Coimbra pela voz do seu fundador

Dr. Almeida Ruas
Numa edição em que assinalamos os 50 anos do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo da ULS de Coimbra, fomos recebidos pelo seu fundador e atual decano da Endocrinologia nacional: o Dr. Manuel Almeida Ruas. A sua especialização em Endocrinologia, interrompida pela presença na Guerra Colonial, e o processo de fundação do Serviço foram alguns dos temas que não ficaram de fora nesta conversa.
Nascido no ano de 1931, em 1957 o Dr. Almeida Ruas conclui a sua licenciatura em Medicina pela Faculdade de Medicina de Coimbra com a nota final de 18 valores. Foi de imediato convidado para assistente da Faculdade na cadeira de Terapêutica, “estava encarregado das aulas práticas e depois, a partir de determinada altura, também de algumas teóricas”, recorda o endocrinologista.
Relativamente ao interesse pela Endocrinologia, surge “porque em Coimbra, na altura, não havia ninguém com esta especialização. Naquele tempo, a nível nacional, existiam poucos endocrinologistas. Assim, pôs-se a hipótese de me diferenciar nesta área e, para isso, solicitaram-se apoios para que o pudesse fazer no estrangeiro”. Desta forma, entre 1961 e 1962, o Dr. Almeida Ruas fez a sua especialização em Paris, no Hospital Pitié-Salpêtrière, com Jacques Décur - “o grande homem europeu da Endocrinologia”. No ano seguinte, “como as doenças da tiroide são muito frequentes na especialidade, fui para o London Hospital, do Raymond Greene, que se dedicava única e exclusivamente às doenças da tiroide”.
Após o regresso, onde voltou ao cargo ocupado anteriormente na Faculdade de Medicina de Coimbra, em 1966, foi reinspeccionado para o serviço militar e apurado para ir para a Guerra Colonial. Foi integrado como médico militar no Batalhão de Caçadores 1891 e colocado em Moçambique entre abril de 1966 e setembro de 1968. Este episódio, recorda o Dr. Almeida Ruas, quebrou o ritmo que trouxe da sua experiência internacional, “mas ressuscitei-o rapidamente, porque voltei para a Faculdade e para o Hospital e, é nessa altura, que se pensa fazer uma diferenciação em Endocrinologia na instituição”. “Primeiro, sob a minha responsabilidade, com alguns colegas de Medicina Geral, foram criadas as consultas de doenças da tiroide e da diabetes e no resto do Hospital começaram a perceber que deveriam encaminhar para nós tudo o que era deste foro”, relembra o especialista.
1974: nascimento do Serviço
A abertura que o 25 de Abril de 1974 permitiu foi também essencial para que pudesse ser criada a especialidade de Endocrinologia. “As pessoas interessadas em diferenciar serviços fizeram uma comissão que foi presidida pelo Prof. Gouveia Monteiro. Então, nessa reunião, com vários colegas interessados, surgiu a Nefrologia, a Hematologia, a Gastroenterologia e a Endocrinologia nos HUC”. É assim que, em 1974, o Dr. Almeida Ruas se torna o fundador da Unidade de Endocrinologia e Doenças Metabólicas dos HUC. Dois anos mais tarde, já com uma equipa a trabalhar consigo, passou a Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, tendo então assumido a função de diretor até à data em que se aposentou, em 2001.
“Quando eu saí, já havia no Serviço uma série de consultas diferenciadas, vários dias da semana, como a consulta da tiroide, a consulta de diabetes e gravidez - que ainda hoje se mantém e que tem uma importância particularmente grande. Havia também diferenciação nas perturbações do crescimento, os nanismos, portanto, quando saí, não era propriamente Endocrinologia no sentido lato da palavra, mas sim já com vários setores, já estava muito desenvolvido”, recorda o especialista.
As Jornadas de Endocrinologia
Em 1979 o seu serviço é responsável pela criação das Jornadas de Endocrinologia e Diabetes de Coimbra - “primeiro começou só por diabetes, durante uns anos eram as Jornadas de Diabetologia de Coimbra, e depois juntou-se também mais um dia para a Endocrinologia”. Este evento é mantido até hoje, tendo decorrido em 2024 a sua 28.ª edição.
Inevitavelmente, o Dr. Almeida Ruas recorda a formação do Serviço de Endocrinologia como um dos momentos mais marcantes da sua carreira. Carreira que foi marcada por uma série de reconhecimentos e distinções pelo papel fundamental que representa para a es-pecialidade. Na data em que cessou oficialmente as suas funções, 7 de junho de 2001, foi-lhe atribuída pelo Ministério da Saúde a Medalha de Prata de Serviços Distintos e foi também reconhecido pela Ordem dos Médicos com a atribuição de uma Medalha de Mérito.
A Endocrinologia atualmente
Questionado sobre como vê a especialidade atualmente, o Dr. Almeida Ruas destaca “a grande evolução que tem existido na Endocrinologia, sobretudo pelas ciências afins. Por exemplo, pela genética - hoje fazem-se os estudos genéticos que, na altura, não fazíamos – e pelo laboratório. Enquanto que, na minha formação, mesmo em Paris e em Londres, as análises eram feitas na urina, o que significava que nós íamos dosear fragmentos das hormonas e através disso raciocinávamos, hoje em dia nada disso se passa. O laboratório de Endocrinologia desenvolveu-se de uma maneira extraordinária em virtude, precisamente, da genética também se ter desenvolvido da forma que hoje sabemos”.
O atual decano da Endocrinologia nacional, termina deixando uma mensagem às gerações mais novas que ingressam na especialidade: “antes de escolherem alguma especialização dentro da Endocrinologia, procurem ter uma panorâmica total do que é a especialidade. Hoje, alguém que entra num serviço de Endocrinologia tem a possibilidade de fazer uma boa formação, pois os profissionais são pessoas bastantes conhecedoras”.
Assista ao vídeo da entrevista
A Menarini esteve aqui
Conferência internacional aborda os avanços no tratamento da diabetes
O Grupo Menarini organizou, nos dias 12 e 13 de abril de 2024, em Florença, Itália, a conferência “Act 2 Day - Diabetes 25 Years After the Start of the New Millennium”. Entre outros objetivos, o evento pretendeu fazer uma atualização dos conhecimentos sobre a relação entre diabetes e outras doenças metabólicas, cardiovasculares e renais, além de promover discussões sobre as barreiras atuais no tratamento da diabetes e a importância de uma abordagem multidisciplinar para o cuidado ideal ao longo de todo o espectro metabólico e cardiorrenal. O tema “quente” do papel da Inteligência Artificial na otimização do controlo da doença também não foi deixado de fora. Dirigida a especialistas em Medicina Geral e Familiar, endocrinologistas, diabetologistas, nefrologistas, cardiologistas e internistas, foram 11 os países europeus presentes. Portugal esteve representado pelo Prof. Doutor Davide Carvalho que participou como palestrante e apresentou o tema “How Early Using New Glucose-Lowering Agents?”.

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